Mais vida com mais saúde e menos custos
15 de julho de 2015

Os custos com a saúde têm tendência para crescer e o sistema tem de mudar em termos de organização, financiamento e governação mas também de estratégia com o reforço de políticas indutoras da promoção da saúde e da prevenção da doença.

“Nos últimos 30 anos as despesas com a saúde têm quase sempre aumentado a um ritmo superior ao observado para o PIB, pelo menos nos países da OCDE. Tudo indica que esta tendência veio para ficar" assevera Carlos Costa, professor na Escola Nacional de Saúde Pública. Esta tendência vale para Portugal e há até uma pressão maior sobre as despesas de saúde, que são pressionadas pelo envelhecimento da população, as alterações climáticas, o alargamento dos cuidados continuados e introdução da inovação tecnológica e nos medicamentos.

Tudo isto coloca o foco na questão de saber se um sistema construído na base da universalidade e tendencialmente gratuito é sustentável. Para José Lages Martins, administrador da José de Mello Saúde, "é forçoso que a sociedade portuguesa se questione, sem peias, sobre se é possível manter estáticos e inalterados os atributos de universalidade, generalidade e gratuitidade, com que o sistema foi estruturado há quatro décadas, ou se é necessário proceder a mudanças significativas adequando organização, o financiamento e a governação do sistema, de modo a poder garantir sustentadamente, com equidade, o acesso dos cidadãos aos cuidados de saúde".

Também Vítor Virginia, director-geral da MSD Portugal, a sustentabilidade financeira a longo do prazo do sistema de saúde "é uma questão de pendor predominantemente político porque os cidadãos em Portugal corno nos outros países, devem estar conscientes dos diversos desafios e das opções a fazer". Assinala que "o futuro vai exigir que as diferentes entidades e instituições actuem de forma responsável em prol da sustentabilidade que todos defendemos" e acentua que a MSD Portugal, "pretendemos ser um parceiro e estamos disponíveis para trabalhar com todos os interlocutores no sentido da sustentabilidade".

A sustentabilidade do sistema de saúde também evoca a questão fiscal que, num contexto de fraco crescimento económico, "está muito dependente da estruturação de um sistema que combine um financiamento preponderantemente feito através de impostos com outras fontes de financiamento independente do Estado nomeadamente de subsistemas como a ADSE" defende ainda José Lopes Martins. Na sua opinião, “o recurso ao crescimento de receita via aumento de impostos é uma solução esgotada e fortemente penalizadora para cidadãos, famílias e empresas: afigura-se por isso importante fazer uma definição política da despesa máxima suportável por impostos e identificar eficiências e fontes alternativas que possam fazer face ao persistente aumento de custos em saúde".

Mas há outras perspectivas sobre o assunto. Miguel Gouveia., professor Católica Lisbon School of Business and Economics, disse numa conferência em Novembro de 2014 que "normalmente discussão pública centra-se à volta de défices e de dívidas: dos hospitais, do SNS, etc. Naturalmente as questões de financiamento são importantes. No entanto as receitas (dos Hospitais do SNS, etc.) não são preços de mercado, têm pouco significado económico. Uma pequena mudança de legislação, muda os défices ou superavits de um hospital sem nada de fundamental mudar. Um aumento de capital muda realmente pouco mas mascara ou adia os problemas". Acrescentava que o importante mesmo "são os custos dos cuidados de saúde produzidos. O relevante é saber se os custos aumentam ou diminuem para uma dada quantidade e qualidade de cuidados de saúde Perder isto de vista é ilusão ou auto-ilusão".

A pressão das doenças crónicas

Nos custos do sistema de saúde ganham relevância, os provenientes dos cuidados às pessoas com doenças crónicas de longa duração. Como se refere no relatório da Gulbenkian sobre o futuro da Saúde, "só se alcançará a sustentabilidade financeira através da redução da incidência destas doenças e da morbilidade que lhes está associada, desenvolvendo para elas novos modelos de cuidados, assegurando que as evidências científicas são aplicadas de uma forma sistemática em toda a parte e que o despendido é reduzido ao mínimo". Refere ainda que "a viabilidade financeira do sistema irá depender da vontade política para incluir a saúde em todas as políticas, da promoção eficaz da saúde e da intervenção concertada dos cidadãos, da sociedade em geral e dos profissionais de saúde".

Carlos Costa acentua que um reforço substancial de políticas indutoras da promoção da saúde e da prevenção da doença" apoia a sustentabilidade do sistema da saúde mas "pode implicar uma alteração radical no actual paradigma de organização da oferta”. Também José Lopes Martins defende a reformulação da oferta, através de conceito de rede "sem sobreposições e com uma muito melhor combinação de serviços - médicos de família em articulação com hospitais, hospitais com uma carteira de serviços que correspondam às necessidades reais dos doentes e não a qualquer outra lógica não racional, e cuidados continuados de proximidade e domicialização".

Na visão de José Lopes Martins o principal papel do Estado deve ser "o de garante do acesso, o de regulador forte e o de contratualizador competente". Se assim acontecer "o sector privado pode ser ainda mais relevante na medida em que introduz competitividade - e por força dela mais eficiência e qualidade nos processos de prestação de cuidados que o Estado deve garantir". O gestor do Grupo Mello, que tem urna longa carreira como administrador na área da saúde, salienta que "há hoje evidencia, através da avaliação e benchmarking do funcionamento de hospitais em regime de parceria público privaria, que permite a retirada de conclusões sobre as vantagens deste instrumento alargado a outros hospitais, para além de outras formas de colaboração institucionalizada entre instituições públicas e privadas.

[Fonte: Jornal de Negócios]